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Título

O Sintoma como Convite: repensando o uso dos remédios na saúde mental

Autora
Dra. Luana Schuarts

Boa leitura.

Muitos pacientes mostram resistência em tomar um remédio para se sentirem melhores emocionalmente. Consigo compreendê-los. Desde que atuo na área da psiquiatria, um sentimento de desconforto me acompanha. Há uma visão dominante de que algo está quebrado e precisa ser consertado. A ideia de que o sintoma aponta para algo disfuncional, errado, desajustado — do qual o portador é, em última instância, o principal culpado.

Também não me soa certo simplesmente silenciar os sintomas. Nosso corpo pode ser nosso aliado. Ele nos aponta para algo incômodo que precisa ser transformado. Mas não chegaremos às respostas sem antes sentir, refletir, compreender. Tolerar certo grau de desconforto, dialogar com ele, pode ser a chave para entendermos o que há por trás da dor que tanto nos incomoda.

Há ainda outra questão desconcertante: será que os remédios não estão maqueando problemas estruturais e coletivos mais profundos? Sabemos que há uma pressão constante por maior produtividade e desempenho. Nesse sentido, vale a pena aderir aos remédios apenas para “funcionar melhor” sem antes questionar a cultura adoecedora por trás do sistema em que vivemos?

Querem nos fazer acreditar que somos os principais responsáveis pelos nossos sucessos e fracassos. Que basta força de vontade, resiliência e pensamento positivo para darmos conta de tudo — como se a mente humana fosse uma máquina ajustável, que deve se adaptar a qualquer engrenagem, mesmo quando essa engrenagem tritura o que há de mais essencial em nós: o tempo, o afeto, o silêncio, o sentido.

Mas a vida não é um processo industrial. Ela pulsa em ritmos próprios, muitas vezes incompatíveis com o mundo acelerado que nos cerca. Quando adoecemos, não é apenas o indivíduo que adoece. É todo um contexto que precisa ser escutado — as relações, os modos de viver, os vínculos rompidos, os sonhos sufocados. O remédio pode ajudar, sim, mas ele não deve silenciar a pergunta mais importante: por quê?

Por que me sinto assim? Por que minha mente está exausta? Por que meu corpo se manifesta com sintomas tão intensos?

Na psiquiatria em que acredito, o medicamento pode ser uma ponte — nunca um destino. Ele pode aliviar o sofrimento, dar fôlego para que possamos olhar para dentro e ao redor com mais clareza. Mas não substitui o trabalho interno, nem o olhar crítico para o mundo.

Por isso, trato cada paciente com cuidado, escutando não só a dor, mas o que essa dor quer dizer. Muitas vezes, ela é um grito de algo que está sendo negligenciado — um relacionamento tóxico, um ambiente de trabalho hostil, uma vida desconectada de seus próprios valores.

Cuidar da saúde mental, para mim, é também resistir. É não aceitar sem questionar. É cultivar um olhar mais humano, mais compassivo — consigo mesmo e com os outros. É entender que o sofrimento não é um defeito, mas um convite. Um convite à mudança, à verdade, à reconexão com aquilo que realmente importa.

Dra. Luana Schuarts

CRM 38301 | RQE 28408

Psiquiatra Curitiba – Psiquiatra Online – Terapeuta Junguiana

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